da mesa de jantar

A brisa percorre o seu caminho por entre as frestas da persiana. 
A janela está aberta, disposta à exposição das nuvens no céu diurno e os meus dedos delineiam a circunferência superior do copo vazio à medida que observo o ecrã bloqueado do meu telemóvel. É meio-dia, e a mesa de jantar nunca estivera tão solitária como agora.
Encaro a garrafa a metade e recordo os motivos pelos quais me levaram a sentir este nó tão apertado na garganta. Pela manhã, havia acordado sozinho no quarto de hotel e ficara a aguardar pela tua presença em cima da confusão de lençóis, contudo, com o tempo passando lentamente, nunca chegaste a aparecer.
Onde estavas?
Não deixaste nenhuma mensagem e, por mais que a minha mente traiçoeira insista em verificar as notificações, eu sei que não me enviarás uma explicação. Mas tudo bem, eu compreendo.
É assim que acabam por passar dias, semanas. É assim que acabo a ouvir sempre o ressoar da cadeira ao que a arrasto para me sentar à mesma mesa, com a mesma bebida em minhas mãos e o mesmo telemóvel pousado em minha frente. A propósito, até ele sente falta das tuas chamadas.
Meio-dia e tu bates á minha porta.
Obrigo-me a levantar com o copo espremido na minha palma e cambaleio em direção ao som. Abro a porta e sinto o vidro escorregar por entre os dedos e estilhaçar-se pelo chão, assim como pequenos pedaços do meu coração. És tu. Sempre foste.
Lágrimas começam a percorrer o caminho pelo teu rosto e abraças-me. Um envolver de braços que preenche todo o vazio e me faz sentir em casa, após tortuosos dias. 
Afastas-te lentamente do meu ombro e deixas os teus braços pender em volta do meu pescoço. Observo os já tão bem conhecidos traços do teu rosto e sorrio carinhosamente enquanto te limpo as lágrimas restantes. ''Silêncio confortável é tão sobrevalorizado'', é a única coisa que me dizes antes de me beijar. E eu deixo-te.
Passamos a noite juntos.
Acho que nunca te disse, mas são nestes momentos em que volto a obter esperança, acabando por esquecer-me de que a realidade sempre espera até que cometamos um pequeno deslize.
Dias passam, fecho a porta da florista e carrego o buquê com o maior cuidado.
Repito mentalmente o discurso que planeara momentos antes enquanto vou em direção a tua casa, sabes que nunca fui muito bom com palavras. Eventualmente alcanço a tua rua, porém quando vejo a tua silhueta preferia não a ter alcançado.
As tuas mãos que outrora estiveram entrelaçadas nas minhas, estavam agora com as de outra pessoa. Sinto o meu sorriso desvanecer-se e o teu olhar encontrar o meu, ao que te vejo distanciar a cada passo apressado que dás em minha direção. A tua boca abre, mas nenhuma palavra sai.
Porque é que nunca dizes o que queres dizer?
Dou-te uma última oportunidade e deixo as flores a teus pés, caminhando devagar na direção contrária e contendo os sentimentos que ameaçam fugir do meu controlo. Espero que venhas atrás de mim, mas não o fazes. Desta vez, não compreendo.
Meio-dia.
Da mesa de jantar consigo ver um corpo desconhecido estendido pelo sofá e as garrafas perdidas pela sala. O gosto na minha boca é amargo, mas não tão amargo como a sensação em meu peito.


- perspetiva acerca de from the dining table por harry styles (onde crio uma história a partir da sua letra)

Comentários

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

florida!!!

primeira cassete

em ruína